"Não vou fazer feijoada na casa da branca, vou virar juíza e voltar aqui”
Juíza Luislinda falou sobre discriminação racial durante palestra da Semana da Consciência Negra
Primeira juíza negra emociona ouvintes durante palestra contra racismo Caio Loureiro
A juíza baiana Luislinda Valois emocionou o público que foi prestigiar o segundo dia de apresentações da Semana Esmal da Consciência Negra nesta quarta-feira (17). O auditório estava repleto de um público diverso, desde militantes pelas causas das ditas minorias até autoridades do Poder Público alagoano. Com a palestra “A Mulher Negra nos Três Poderes da República”, a juíza discorreu sobre o racismo, sobretudo contra as mulheres negras e nordestinas.
“Luto pelos ‘PPPs’, aqueles que são chamados de ‘pretos, pobres e periféricos’. Luto pelas mulheres negras e nordestinas porque são as mais discriminadas do País, inclusive, luto pela inclusão de mais mulheres na magistratura”, afirmou Luislinda, que foi a primeira mulher negra a exercer o cargo de magistrada, em 1984, e a proferir uma sentença contra o racismo no Brasil.
Em meio a uma palestra emocionante, a magistrada não conteve as lágrimas ao relembrar de um preconceito sofrido por ela quando ainda era criança. A juíza afirmou que seus pais não tinham dinheiro para comprar o material da escola e, por isso, seu professor opinou que seria melhor ela parar de estudar e ir fazer “feijoada na casa da branca”. Com a voz embargada, Luislinda comentou que saiu aos prantos, mas voltou e respondeu: “eu não vou fazer ‘feijoada na casa da branca’; eu vou estudar, virar juíza e voltar aqui”, relatou, arrancando uma salva de palmas da plateia.
A magistrada também abordou a condição de conformidade dos nordestinos; relembrou o papel de Zumbi dos Palmares para a história dos negros no Brasil; respondeu a questionamentos da plateia sobre a condição vulnerável da mulher negra na pós-escravidão, dentre outras temáticas.
“Participar deste momento em Alagoas é algo gratificante, pois aqui é a terra de Zumbi, a terra da Consciência Negra. É marcante na minha vida, mais um passo que dou na luta pelas ditas minorias”, afirmou Luislinda, enfatizando que “estar neste Estado, onde o Poder Judiciário é comandado por uma mulher, é luxuoso demais”.
Histórico Premiado
Luislinda Valois reativou dezenas de Juizados Especiais em municípios da Bahia, criou a Justiça Itinerante - sala de audiência instalada dentro de um ônibus que atende os bairros carentes de Salvador e Feira de Santana - e o Juizado Itinerante Marítimo, que conduz profissionais até as ilhas da Bahia. Coordenou ainda o Balcão de Justiça e Cidadania e levou a lei às comunidades quilombolas e aos índios. Nas horas livres, Luislinda dá palestras em escolas públicas para que os jovens conheçam seus direitos e deveres.
O Programa Justiça, Escola e Cidadania, idealizado por ela, atingiu mais de 5 mil estudantes. Sua militância também se estende à escrita: publicou o livro “O Negro no Século XXI”, uma reflexão sobre a participação dos afrodescendentes na sociedade atual, lançado na Escola Superior da Magistratura (Esmal) na IV Bienal Internacional do Livro de Alagoas.
A magistrada baiana também é vencedora do Prêmio Claudia 2010 na categoria Políticas Públicas.













